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Trabalhador desenvolve leucemia após exposição ao benzeno e empresa recusa emissão de CAT

quinta-feira, 27 Novembro, 2025

Um trabalhador da indústria petroquímica do Rio Grande do Sul desenvolveu Leucemia Mieloide Aguda (LMA) após meses de exposição ao benzeno — substância reconhecidamente cancerígena — e enfrentou a recusa da empresa em emitir a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), mesmo diante de um quadro clínico grave. O caso foi apresentado no Senado Federal por representantes do Sindipolo-CNQ-CUT, durante sessão que discutiu riscos químicos e saúde do trabalhador.

O jovem ingressou na empresa em março de 2023, inicialmente como estagiário, sendo efetivado meses depois na área de Aromáticos, setor responsável pela produção de benzeno, butadieno e outros agentes tóxicos. Seu exame admissional não apresentou anomalias, o que o considerou apto para a função.

No entanto, em julho de 2024, o hemograma periódico já mostrava alterações significativas em glóbulos brancos, vermelhos e plaquetas. Segundo a Portaria nº 776 do Ministério do Trabalho, a empresa deveria ter realizado três hemogramas adicionais em até 45 dias — o que não ocorreu.

Sem acompanhamento adequado, o quadro evoluiu. Em janeiro de 2025, o trabalhador desmaiou pela primeira vez. No mês seguinte, passou mal novamente dentro da planta industrial. Mesmo assim, ao buscar o ambulatório, ouviu que “estava tudo normal”, segundo relato apresentado no Senado.

Em 6 de março, inconformado com a piora da própria condição física, ele buscou um cardiologista particular. Os exames demonstraram alterações graves, levando o médico a indicar internação imediata por anemia profunda.

O trabalhador continuou em atividade até 10 de março e foi internado dois dias depois,em um hospital de Porto Alegre. Dias depois recebeu o diagnóstico definitivo, Leucemia Mieloide Aguda, doença associada à exposição ocupacional ao benzeno. Ele permaneceu hospitalizado por quase cinco meses, em tratamento intensivo com quimioterapia.

Empresa nega vínculo e se recusa a emitir CAT

Segundo o Sindipolo, a empresa — identificada como Braskem — negou emitir a CAT, contestando a relação entre o adoecimento e a atividade laboral. A recusa persistiu mesmo após solicitações formais da CIPA e do Grupo de Trabalho do Benzeno (GTB).

Diante da omissão, o sindicato apresentou denúncia à Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do RS (SRTE/RS). Auditor fiscal médico da SRTE determinou que a empresa emitisse a CAT até o fim de agosto, mas a ordem não foi cumprida.

Com base em exames, laudos e documentos, o caso foi encaminhado ao projeto Caminhos do Trabalho, grupo multidisciplinar ligado à Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Após análise técnica, médicas do projeto emitiram a CAT, reconhecendo o nexo causal. O documento segue agora para avaliação do INSS, que analisará o benefício por doença ocupacional.

“Nenhum trabalhador deveria adoecer ou morrer por causa do trabalho”

Ao apresentar o caso, os representantes do Sindipolo-CNQ-CUT destacou que a situação não é isolada e representa um risco constante enfrentado pelos trabalhadores do setor petroquímico. Eles pediram que o tema seja levado à Comissão de Direitos Humanos e à Comissão de Assuntos Sociais do Senado.

“O benzeno é comprovadamente cancerígeno. A vida e a saúde dos trabalhadores não podem ser tratadas como custo de produção”, afirmaram os representantes.

O caso reacende o debate sobre as falhas na vigilância à saúde de trabalhadores expostos a agentes químicos altamente tóxicos, a omissão empresarial diante de protocolos obrigatórios, a necessidade de fortalecimento da fiscalização trabalhista e a subnotificação de doenças ocupacionais no Brasil.

Para especialistas, a LMA associada ao benzeno é uma das doenças ocupacionais mais graves e de maior impacto na vida laboral e social das vítimas, exigindo resposta institucional urgente.